2022, o ano da Copa do Mundo… E é nesse contexto que a animação pelos jogos se mistura com a ansiedade para conseguir completar o famoso álbum da copa! Mas, afinal, você sabe o que está nos bastidores? Sabe o que é o mercado de figurinhas? Continue a leitura e descubra!
Por que falar sobre economia das figurinhas?
Estimulado por uma recente reportagem do jornal Folha de S. Paulo, que dava conta do envolvimento do Estado na negociação com a empresa Panini para a produção e distribuição dos pacotes de figurinhas na Argentina, razão da escassez nas principais e tradicionais bancas da cidade de Buenos Aires, resolvi cometer este textinho sobre a “economia das figurinhas”.
De pronto, vale comentar o efeito inflacionário. O pacotinho, ainda em 2018, para ficar na última copa, custava R$2. Agora, R$4. Dobrou! O IPCA acumulado, realçando a perda do valor de compra do Real, entre março de 2017 a março de 2022, ficou em 31,32%. O álbum está 63% mais caro hoje.
Ou seja, a inflação do mercado de figurinhas superou, com vantagem, a inflação geral, dos índices oficiais. O mundo das figurinhas parece viver uma realidade paralela.
O caso argentino e o brasileiro
De todo modo, o forte aumento parece não ter desestimulado a demanda pela coleção. Ficaram conhecidos os inúmeros relatos, como o caso argentino – figurinhas, na Argentina, se revelou uma questão de Estado – sobre a falta e escassez das figurinhas em inúmeros pontos de venda.
Em especial, as tradicionais bancas. Isto também ocorreu aqui no Brasil, criando uma expectativa pela chegada de novos carregamentos às bancas.
Pode ter sido, por um lado, uma má estimativa da Panini sobre a eventual procura pela coleção. Por outro lado, pode ter sido um efetivo problema de oferta mesmo, de produção. O mais provável é o desencontro entre oferta/demanda.
Demanda alta, que exigiu um recálculo das condições de produção/oferta. A Panini, mesmo por estratégia, penso, provavelmente estimou de forma equivocada a real demanda pelas figurinhas nesta Copa do Qatar. O mercado já se iniciou muito aquecido.
Aqui a resposta da economia comportamental: depois de dois anos e meio de pandemia, aflorou o espírito colecionador, quase como uma onda/febre, com o natural efeito socializador do encontro para trocar figurinhas. Os inúmeros pontos de trocas servem como pontos de encontro, de socialização, válvulas de escape. E o ser humano precisa disso. E a economia consegue descrever este comportamento.
O Mercado de figurinha paralelo
No mercado tradicional de figurinhas, vale destacar ainda a criação de um mercado à parte, aqui intencionalmente moldado para a escassez, que são as figurinhas extras, raras, colecionáveis, mas não necessariamente integrantes do álbum.
Assim, modulação artificial da escassez proporciona a criação de um mercado paralelo, inclusive de compra e venda de figurinhas raras, qual o mercado das tulipas, em Amsterdam, no Séc. XVII. A escassez potencializa a atração, o fascínio pela raridade.
E, naturalmente, a figurinha rara se converte em moeda e/ou moeda de troca. A economia comportamental aqui novamente explica o fenômeno, tal qual uma mania, inclusive das eventuais bolhas especulativas das figurinhas raras.
Ganhar na loteria é mais fácil que completar o álbum gastando pouco
Mas, voltando às figurinhas regulares, um dos objetivos dos colecionadores é completar o álbum gastando o menor valor possível, que já está bem mais caro, como se viu acima. Se, por acaso divino, ao comprar pacotinhos de figurinhas, não saíssemos com nenhuma repetida, só inéditas, o valor para completar o álbum seria de R$536 para as 670 figurinhas. Mais o preço do álbum, naturalmente.
Isto é praticamente impossível! Mais fácil ganhar na loteria. A chance de ganhar na mega-sena é de 1 em 50 milhões. De não ter repetidas em 148 figurinhas (somente 22% do total) é de 1 em 55 milhões.
Mas, afinal, quanto se gasta para completar o álbum da copa?
Daí que simulações – em um universo de 100 mil casos – mostram que, se você quiser completar o álbum, sem realizar nenhuma troca, você gastaria, em média, R$ 3.805,26. O colecionador mais sortudo gastaria R$ 2.168,00 e o mais azarado, R$ 9.650.
Aí chegamos, talvez, naquilo que é o mais bacana do “mercado das figurinhas”, que é o mercado das trocas. É ínsito ao mercado das figurinhas a criação natural e paralela do mercado das trocas, qual uma verdadeira teoria dos jogos, em um jogo cooperativo.
O lugar para se realizar as trocas
A criação física do lugar para se realizar as trocas. Uma praça, as escolas, em frente a uma banca famosa, os shoppings. São verdadeiros mercados físicos, balcões de negócios de figurinhas, mas que atraem naturalmente regras e etiquetas de funcionamento. Uma regular por outra regular. Uma brilhante por outra brilhante. Horário de funcionamento.
Nesse sentido, até lances em dinheiro, o que – de certa forma – escapa à etiqueta e à ética da maior parte dos colecionadores. É o mercado – antes, uma realidade abstrata – em verdadeira construção e funcionamento.
Os modelos de troca do mercado de figurinhas
Assim, o segundo fenômeno, mais atinente ao jogo cooperativo, permite o desenvolvimento de modelos alternativos de troca. Por exemplo, em alguns shoppings de Belo Horizonte, tornou-se ilustrativo um painel acrílico com recipientes para figurinhas.
Este painel é preenchido com figurinhas e os colecionadores vão naturalmente verificando a figurinha que lhes falta. Ao encontrar uma inédita, pegam a figurinha, e repõe o quadro com uma figurinha repetida sua. Ou seja, um verdadeiro balcão de troca coletiva. Que gera igualmente o efeito de respeito e/ou constrangimento diante do painel. Ao pegar uma figurinha, você deve repor o quadro. Ninguém fiscaliza e todos fiscalizam ao mesmo tempo!
O senhor-figurinhas
O senhor-figurinhas ou o profissional das figurinhas. Com a criação do mercado, era natural e esperado que este personagem surgisse. É o sujeito que se torna colecionador profissional, e que normalmente tem uma banca ou um fichário com todas as 670 figurinhas. Ele vira uma espécie de provedor de liquidez ao mercado, em especial para os colecionadores que estão a poucas unidades de completar o álbum. A Panini também tem esta função de provedor de liquidez!
Este colecionador ainda pode tentar a sorte dos pacotinhos ou a troca individual, mas o processo se torna mais penoso. Assim, o profissional das figurinhas abastece o mercado com as últimas figurinhas faltantes para você. Só que, aqui, ele “cobra” um preço maior. Exige mais figurinhas para aquela faltante. Novamente, a economia explica o caso: a figurinha faltante para você é rara (na sua percepção).
Então, utilidade para você é alta. Justamente por ser a figurinha que falta para você completar o álbum. Daí o senhor-figurinhas extrai “renda” desse seu desejo de completar o álbum. Mas veja: isto não é necessariamente ruim. Ele provê assistência para que os colecionadores completem o álbum. E ao mesmo tempo renovam seu estoque para continuar proporcionando o “mesmo serviço” para mais colecionadores.
Portanto, o mercado de figurinhas fornece uma verdadeira aula de economia. E aí: diante destas informações, qual é a sua estratégia para completar o álbum da copa?
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